22 de julho de 2021 gabrielestevam

Como o Brasil pode ganhar R$ 2,8 tri com a retomada verde

Um estudo exclusivo mostra como o país pode sair da crise e crescer 15% mais do que o previsto até 2030. A receita: reduzir as emissões de carbono

Amazônia: dono da maior biodiversidade do planeta, o Brasil só tem a ganhar com a sustentabilidade (Leo Correa/Glow Media/AP)
Um dos maiores exemplos de como a preservação do meio ambiente deixou de ser um papo de ongueiro e ganhou papel central no capitalismo brasileiro em tempos de pandemia é a história da companhia de gestão ambiental Ambipar. Fundada em 1995 para lidar, entre outras coisas, com crises ambientais (na lista está a recuperação de Brumadinho após o desastre na mina da Vale em janeiro de 2019), a empresa abriu o capital na B3, a bolsa de valores de São Paulo, em junho deste ano. Em meio à maior crise econômica em décadas, a empresa fez uma das ofertas iniciais de ações mais concorridas do mercado acionário brasileiro: 1,08 bilhão de reais, uma demanda dez vezes superior à projetada. De lá para cá, as ações da Ambipar valorizaram 11%. A novata vale 3 bilhões de reais, mais do que varejistas como Marisa e Hering.

O que chama tanto a atenção dos investidores é o fato de a empresa ter virado uma espécie de “Mercado Livre de lixo”. Funciona assim: quem está disposto a fazer uns trocados com quinquilharias como celulares velhos, garrafas PET usadas e pneus furados pode anunciar pelo site. Os compradores são certificados pela Ambipar para garantir o retorno dos itens à cadeia produtiva — seja reciclados, seja utilizados do jeito que estão. “Damos vida nova a itens que iriam para o lixo”, diz Fernando Begliomini, diretor de logística reversa da Ambipar. O processo colabora para diminuir a necessidade de fabricar do zero plásticos, metais e por aí vai. De quebra, reduz a poluição envolvida nessa produção. “Isso é a nova economia”, afirma.

O ímpeto da Ambipar na B3 é só mais uma pecinha num tabuleiro enorme, jogado por capitalistas mundo afora, para reavivar a economia por meio de uma guinada verde de empresas, investidores e governos. No centro dos objetivos está a redução das emissões de carbono vindas de combustíveis fósseis, como o petróleo — um dos vilões do aquecimento global. Trata-se de uma tendência global, com iniciativas pipocando da China à Califórnia. Um exemplo é o “Green Deal Europeu”, apresentado pela União Europeia em maio. O objetivo: destinar 40% de um pacote de socorro de 750 bilhões de euros a negócios à base de energias renováveis. A recuperação da crise do coronavírus deve estar calcada “na transformação ambiental e digital”, disse Frans Timmermans, delegado da Comissão Europeia, à frente do plano.

Para o Brasil, país com a maior biodiversidade do mundo, a guinada verde traz oportunidades grandiosas. Em números, isso significa crescer 15% mais do que o previsto até 2030, o que agregaria 2,8 trilhões de reais ao produto interno bruto em dez anos. A riqueza adicional abriria 2 milhões de empregos na economia — metade deles na indústria. É o que estima um estudo inédito do WRI, uma das principais entidades ambientalistas dos Estados Unidos, junto a pesquisadores brasileiros da PUC-Rio, da escola de negócios Coppe/UFRJ, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, além da Febraban, a federação dos bancos brasileiros, e dos think tanks Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) e Climate Policy Initiative. “Muitos países emergentes podem se beneficiar dessa transição econômica”, afirma Helen Mountford, vice-presidente do WRI. “Mas o Brasil tem algumas características que o colocam à frente dos outros, como uma matriz energética limpa.” Trata-se de um manual para o país superar a crise.

Para dimensionar os benefícios dessa retomada verde à economia brasileira, os pesquisadores mapearam 10.000 tecnologias com emissão reduzida de carbono e as políticas em curso para adotá-las no governo e na iniciativa privada. No radar estavam propostas como a integração fazenda-lavoura-pecuária, uma técnica de aumento da produtividade no campo criada pela estatal Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) com base no melhor uso do solo de pastagens. Ou os incentivos para a troca da fonte de energia na indústria brasileira, hoje ainda muito dependente do petróleo e do carvão, para fontes limpas — foco do programa RenovaBio, do governo federal. Os pesquisadores projetaram a evolução do PIB até 2030 em cenários com a evolução desses programas. Em paralelo, mediram a evolução do PIB caso nada seja feito. “Não são simples previsões, são cenários possíveis com base em variáveis econômicas existentes”, diz Roberto Schaeffer, professor da Coppe/UFRJ.

Parte relevante do setor produtivo brasileiro já compreendeu o potencial de tecnologias verdes para sair da crise. Na sucroalcooleira Raízen, a produção da safra anual de um tipo de etanol chamado E2G, com emissão de carbono 35% inferior ao padrão, foi praticamente 100% vendida nos três primeiros meses do ano — já com a economia global afundando nas incertezas da pandemia. Em produção desde 2019, o E2G foi desenvolvido ao longo de sete anos e está entre as apostas da Raízen para os próximos anos. “Em alguns momentos, questionei a viabilidade da
tecnologia”, diz Ricardo Mussa, diretor-presidente da Raízen. “Neste ano, ela provou seu potencial.” Na lista de mercados do produto estão regiões com leis duras para a emissão de carbono, como a Califórnia.

Fonte: https://exame.com/revista-exame/como-o-brasil-pode-ganhar-r-28-tri-com-a-retomada-verde/